Sobre a angústia

por Marcia Mendes

 


“No dia da minha angústia clamarei a ti,

pois tu me responderás” (Sl 86.7)
 


Quando se está angustiado experimenta-se o sangramento da alma, que escorre como em um conta-gotas. Nasce o vazio no estômago, uma fome incapaz de ser satisfeita. Um oco que não é preenchido por nada. Torna-se difícil alcançar o desejo. E você, tem fome de quê? E mais, qual o tamanho de sua fome? É na angustia que a finitude nos abarca. Dói o espírito e o corpo acompanha. Há arte na dor, há poesia nas palavras e vazios podem ser intermináveis quando o coração quer falar, mas não há linguagem possível. A angustia é repressora de qualquer paz porque nos coloca no meio do nada - desamparo e aflição. Anoitecemos na angústia e amanhecemos em qualquer fé. Há que se colocar palavras nos bichos que nos ferem a boca. (Marcia Mendes, in Cadernos de Psicologia, 2010)


Para complementar, segue um poema de minha autoria:

 
Catedral
Marcia Mendes

Porta de catedral
Carece de educação.
O portal,
Onde se assentam as fechaduras,
Deve ter fé.

Pacto do humano com o belo
Para que o mal
Não nos machuque os ouvidos.

Oro pelos portais que firmam,
Pelas portas que detém,
Pelas palavras que aceitam o silêncio
E permanecem mergulhadas
No quieto mar da paz.

Se um dia,
Minha catedral ruir,
Não serão ouvidos os sons dos demônios
Assentados nos frontispícios,
Saídos de línguas-feridas,
Mas a canção dos anjos,
Tocadas nas harpas da carne
Que ora.